sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Rochosas Canadenses

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Há pelo menos seis meses na planície e talvez um ano sem fazer uma boa caminhada fomos, entre o final de julho e início de agosto, matar a saudade desses morros de que tanto gostamos. E se tratando de montanhas no Canadá é difícil, pelo menos para mim, não considerar uma visita às Canadians Rockies. Puxando bem a memória, acredito que a primeira vez que ouvi falar dessa região foi há uns dezesseis anos, quando costumava comprar a revista Caminhos da Terra. Era uma reportagem que falava, dentre outras coisas, sobre a estrada que leva a Jasper, a viagem de trem pelas Rochosas e os mega-ônibus para subir as geleiras. Impressionante como o cérebro é seletivo e guarda apenas boas lembranças, quando preciso dele para outras coisas, como fórmulas e equações, ele simplesmente as rejeita e me deixa na mão…
De Waterloo até Calgary são 4 horas de vôo, aproximadamente 3500 km. Um pedaço de chão nesse imenso país que é o Canadá. O impressionante é que apesar de ser um país tão grande, a natureza se deu o capricho de concentrar tudo quanto é morro próximo da costa oeste. Tá certo que bem ao norte da costa do Atlântico existem montanhas também, mas é um tipo de viagem que exige uma logística complexa e bastante tempo disponível.
Tivemos 10 dias para rodar pela região, pouco tempo para a quantidade de atrações disponíveis. Com isso tivemos que ser bem seletivos e dosar um pouco de turismo convencional com algumas caminhadas. Para facilitar nossa vida, alugamos um carro próximo ao aerporto de Calgary. De ônibus seria bem complicado fazer esses passeios. Provavelmente deve ter uma linha de Calgary até Canmore e Banff. O resto teria que ser por carona ou agências de turismo, que no final deve ficar bem mais caro do que alugar um carro.
Antes de virmos para o Canadá havia feito pesquisas genéricas sobre o país e, numa dessas, me deparei com uma brasileira, montanhista e que mora nas Rochosas. Quando decidimos que iríamos fazer essa viagem, não pensei duas vezes em procurar a Helena Artmann. Após alguns contatos por e-mail, ela nos recebeu com toda simpatia assim que chegamos em Canmore, distante 100km de Calgary, no coração das Rockies. Meio perdidos devido ao sem número de opções de passeios, seguimos as dicas da Helena e montamos um esquema entre caminhadas de dificuldade média e passeios turísticos. Outras referências que nos ajudaram foram alguns mapas topográficos da região, um guia que baixamos pela internet e um livro-guia que compramos em Calgary e gostamos: Don’t Waste Your Time in the Canadian Rockies. Não é um título que normalmente me atrai, mas nos vendo com dificuldade entre tantas opções na livraria, uma senhora nos sugeriu esse livro e acabamos ficando com ele. Além dos passeios, nos informamos também sobre as advertências que havíamos lido sobre ursos e como se portar nas trilhas em relação a eles.
IMG_6699_PAN_small_GFEstacionamento de um supermercado em Canmore, AB
IMG_5862_small_GFEstrada a caminho de Jasper
Saímos de Canmore já no final da tarde e resolvemos seguir o cenário turístico pela Trans-Canada Highway e Icefield Parkway, estradas que levam a Jasper. Pegar a estrada logo de cara foi uma forma de familiarizar aos poucos com as distâncias, regras dos parques etc. São vários parques conectados, localizados nas províncias de Alberta (AB) e British Columbia (BC). O primeiro deles pelo nosso roteiro foi o Banff National Park. Depois passamos pelos Parques Nacionais de Jasper, Yoho e Kootenay. Logo na saída de Canmore fomos entender que a entrada dos parques fica na própria estrada, como se fosse uma praça de pedágio. Paga-se $19,60 por dia para transitar pelos parques, mais a área de camping cujo preço varia em função da infraestrutura disponível. No início assustamos, pois passaríamos em vários parques no mesmo dia e pensamos que para cada um teríamos que pagar essa taxa. A diária paga para transitar pelos parques nacionais é cumulativa e, dependendo do número de diárias pagas, ao alcançar o valor de uma anuidade é possível solicitar um cartão que vale para todos os parques nacionais do território canadense pelo período de um ano. No final das contas, ao final da nossa viagem, acabamos pegando esse passe anual cujo valor é de $136,00 para um grupo de até 7 pessoas no mesmo carro.
Em estradas maiores, como a Trans-Canada, em vários lugares existem pontes, ou pontos de travessia, para os animais (ursos, veados, alces e outros) cruzarem a estrada. Longos trechos são cercados por tela dos dois lados para evitar acidentes com os carros. Me parece que a idéia é colocar isso ao longo de toda a rodovia, pois vimos muita obra em andamento. Achei muito interessante esse sistema, pois torna as estradas mais seguras e permite aos animais trafegarem em seu território sem correr perigo.
IMG_6684_small_GF Ponte sobre a estrada para passagem de animais
IMG_5858_PAN_small_GF Lago Waterfowl – manhã do primeiro acampamento
IMG_5854_small_GFFervendo água para o “café”
As áreas de acampamento também causaram certa surpresa. Pela proximidade da estrada, achamos que existiriam mais áreas com infraestrutura de chuveiro e local para lavar vasilhas. Pode parecer frescura para quem já ficou quase uma semana sem tomar banho – o que dirão colegas que ficam até 15 dias, mas, podendo, não dispenso um chuveiro. Como o volume de pessoas é grande, as áreas com esse tipo de conforto lotam bem rápido. Já escurecendo e a caminho de Jasper, resolvemos parar e passar a primeira noite na área de acampamento Waterfowl. Muito bem arrumada, com sanitários limpos e área coberta para cozinhar, porém sem chuveiro… Opção 1 é ficar sem tomar banho e a 2 é entrar no lago de água gelada. Como a situação não era extrema, optamos pela 1. O preço é bem salgado para uma área desse tipo, $21,50 por barraca tendo que sair até às 11:00 do dia seguinte. A proximidade com a estrada é de certa forma desagradável, mas há de se pensar também na facilidade que isso proporciona ao viajante e para própria manutenção do parque. Com o tempo, acostumamos com o barulho e vimos que isso seria uma constante. Quando não fosse o barulho dos carros durante a noite, seria o da ferrovia ou os dois em conjunto. De toda forma, acho que a melhor maneira de viajar pela região é acampando, pois isso dá mais liberdade de locomoção e mudanças de plano e fica bem mais barato. Outra opção é alugar um motorhome. Não tenho ideia do preço, mas para um grupo com mais de duas pessoas acredito que é seja uma boa opção, muita gente usa.
Passada a noite, seguimos para Jasper com a intenção de voltar para o acampamento de Lake Louise, este com chuveiro, no final da tarde. O passeio de carro até Jasper é de tirar o fôlego. Se a pessoa tiver apenas 2 dias na região, vale a pena fazê-lo sem medo. São uns 420km desde Calgary e não precisa se afastar mais do que um metro do carro para curtir a paisagem. Bem próximo a Jasper, já na volta, pegamos uma estrada alternativa que acredito ser um trecho do traçado original da Icefield Pkwy. Por ser uma via secundária foi possível ir mais devagar, apreciar o caminho por dentro da floresta e parar em pontos menos badalados como o lago da foto abaixo. Mesmo na estrada principal tem muita coisa bonita pelo caminho: geleiras, rios e lagos de água verde, florestas, cachoeiras e as próprias montanhas. Existem também pontos de parada com sanitários e mesas para piquenique. Só faltou umas lanchonetes com pão-de-queijo com pernil e/ou linguiça, seria a perfeição ;) . Pensando no turista comum ou sem tempo, o atrativo mais interessante nessa estrada é o passeio de ônibus ou a pé pela geleira Columbia Icefield. Nós não fizemos porque já tivemos a experiência de nos aproximar de geleiras em outras ocasiões. E, particularmente, a idéia de subir de ônibus não encheu tanto os meus olhos como há dezesseis anos quando li o artigo da reportagem citada. Mas, sem dúvida, não nego que seja uma ótima forma de tornar esse tipo ambiente acessível a um grande número de pessoas que, de outra maneira, não vivenciariam essa experiência.
IMG_5874_small_GF Lago em uma estrada secundária próximo a Jasper
IMG_5884_small_GFCaminho para Jasper
IMG_5895_PAN_small_GFGeleira Columbia Icefield
De volta a Lake Louise, já no final da tarde, fomos para área de acampamento e descobrimos que estava lotada… O jeito foi sair em busca de outro lugar, no caso o acampamento Protection Mountain, para mais uma noite sem banho. Ao sair de Lake Louise errei a estrada e ao invés de pegar um secundária que levaria a área de acampamento indicada, caí na principal. Sem ter como voltar seguimos até Castle Junction para pegar a estrada de volta. Em um daqueles golpes de vista certeiros, vi uma plaquinha tímida do Hostel International. Foi a salvação. Além do conforto do banho, conhecemos um pessoal bem bacana. O gerente do Castle Mountain Hostel é uma figura a parte, seu humor meio sinistro pode assustar alguns. Foi interessante porque quando chegamos estava meio vazio e deu para conversar um pouco mais com o pessoal que já estava por lá relaxando. Um deles foi um simpático senhor de Nova Iorque (EUA) que estava sozinho fazendo uma travessia de NY até Vancouver em uma Moto Guzzi 850cc da década de 70. Conhecemos também um guia e uma guia de montanha de Jasper que trabalham com resgate para o parque. Um dos guias, Max Darrah, já esteve em Belo Horizonte na casa de uma família de amigos brasileiros que seus pais conheceram enquanto faziam pós-graduação em Calgary. Muito engraçado como o mundo é pequeno.
Passada a noite no hostel, seguimos depois do café para Lake Louise onde desta vez conseguimos uma vaga na área de acampamento. O lugar é enorme, lugar para 206 barracas e 189 motorhomes. Se pensar em uma média de três pessoas por vaga, chega-se em uma mini cidade com quase mil e duzentos habitantes. É meio assustador fazer essa conta, mas a organização impecável não nos deixa notar esse grande volume de gente. O que mais chamou atenção nessa área de acampamento foi a cerca eletrificada no perímetro da área destinada às barracas. Como Lake Louise fica em um território de ursos e sua localização é estratégica para quem está visitando a região, essa foi a solução encontrada. A sensação é muito estranha, mas de certa forma confortável. Exagerando um pouco, me senti naquele filme do Jurassic Park.
IMG_5924_small_GFCerca eletrificada no acampamento de Lake Louise
Me parece que essa é a única área de acampamento com esse recurso. Nos outros lugares que ficamos é extremamente aconselhável não deixar nada de comida dentro da barraca. Se o acampamento for próximo ao carro, deve-se deixar tudo dentro do veículo. Para as pessoas que viajam de bicicleta, moto ou a pé, em algumas áreas de camping existem caixas reforçadas para se colocar o mantimento. Em outras, são colocados cabos de aço entre as árvores para que o alimento seja içado e colocado fora do alcance dos ursos. Quando a área de acampamento não providencia esse tipo de ajuda, é necessário instalar a própria corda para deixar os alimentos no alto. Tudo isso porque o cheiro da comida atrai os ursos. Em acampamentos mais selvagens, é necessário tomar cuidado também com tudo que tenha algum cheiro pronunciado. A coisa é realmente delicada. Com o cansaço a gente acaba dormindo, mas não é algo muito tranquilo para quem não está acostumado, principalmente a levantadinha básica de madrugada para ir ao banheiro…
Essa preocupação com os ursos esteve mais presente do que imaginávamos. Uma coisa é ler na internet e livros, outra é escutar de pessoas, como a Helena e os guias que conhecemos no hostel, os casos e os cuidados a se tomar. O que mais gosto ao colocar a mochila nas costas e sair por aí, é deixar a mente solta. Curtir o silêncio e deixar a paisagem ir lavando o cérebro e o corpo é muito relaxante, mesmo quando se carrega 20kg ou se pena com a altitude. Tá certo que não tem esse glamour todo, mas é muito bom. Já com a ideia de encontrar um urso pelo caminho a coisa fica bem diferente. Durante boa parte do tempo é necessário fazer barulho para assustá-lo e assim evitar o encontro. Parece que o maior problema é o animal ser surpreendido e se sentir acuado. Isso pode aumetar bastante a chance dele ficar agressivo e partir para o ataque para se defender. É um saco ter que caminhar gritando, principalmente nas áreas de floresta onde o alcance da visão é restrita. Encontrar um bicho desses não deve ser nada divertido. Praticamente durante todo o tempo em que caminhávamos em áreas de floresta, ficamos em alerta. É tão sério que é extremamente aconselhável andar com um spray, tipo esses de pimenta, para o caso de um incidente mais de perto :-/ . Em algumas trilhas existe restrição quanto ao tamanho mínimo do grupo de caminhada, pois dizem que a chance de um urso atacar 4 pessoas juntas é bem menor. Dependendo da época, algumas trilhas chegam a ser fechadas.
IMG_5927_small_GFLake Louise com o monte Lefroy ao fundo
Atentos aos cuidados que deveríamos tomar seguimos para nossas caminhadas, três no total. A primeira foi próximo ao lago Louise, no Banff National Park. Caminhamos pela trilha “Plain of the Six Glaciers”. O início da caminhada é pela margem do lago bem no fuzuê turístico. Depois de alguns minutos na companhia de grupos de japoneses com câmeras gigantes (ô inveja…) e após ultrapassar outras tantas excursões, o caminho vai aos poucos ficando mais livre. Ao final do lago segue-se por um trecho de floresta até a trilha propriamente dita. A partir desse trecho é uma subida por uma moraina com a trilha já bem batida que leva a uma casa de chá a 2.090 m construída em 1924 pelos suíços que trabalhavam na Canadian Pacific Railway (companhia ferroviária). Da casa de chá é possível seguir adiante até um mirante a 2.175 m. Seguimos pela crista da moraina que leva até o mirante, onde fizemos nosso lanche. A trilha é de fácil para média. Mas foi bem cansativo e desanimador, pois estavamos fora de forma e passar por isso logo na primeira caminhada nos deixou meio ressabiados. Na volta optamos por um caminho diferente que leva a outra casa de chá no lago Agnes a 2.135 m, essa construída em 1901. Durante a descida senti um pouco os joelhos, logo eu que, dentre a nossa turma, não costumo ter esse tipo de problema. Fizemos uma pequena pausa no lago Agnes e no lago Mirror, depois seguimos direto para o estacionamento, onde cheguei bem cansado. Falar que a vista é linda é chover no molhado. Essa trilha é bem interessante para quem tem pouco tempo.
IMG_5945_small_GFLake Louise visto do mirante do Six Glaciers
Por ser bem movimentada, acaba sendo de certa forma segura também. Mesmo assim, como foi a primeira, ficamos com aquela desconfiança mineira quanto aos ursos. Principalmente na volta, pois pegamos um caminho diferente e menos frequentado que o da ida. Nessa trilha alternativa tem um desvio que também leva ao lago Agnes e passa pelo Big Beehive, um mirante que deve ter uma vista espetacular. Nós estavamos bem cansados e optamos por não ir até lá. Fica como dica. Ida e volta deram entre 5,5 e 6 horas de caminhada, incluindo as paradas para lanche. Depois da caminhada fomos de carro até o lago Moraine, que fica bem próximo. Ele é tão azul que a impressão é de que se trata de tinta ao invés de água. Nunca havia visto um lago com coloração tão intensa. Já estava no final do dia e caminhamos um pouco pela margem e, pela primeira vez, vimos duas trilhas com restrição de tamanho de grupo por causa de urso. O interessante é que próximo da placa tem um banco, assim quem quiser pode ficar por ali esperando outras pessoas para dar o número mínimo exigido e seguir em frente. Não tem niguém na “boca” da trilha vigiando a entrada das pessoas, mas pelo que entendi se alguém for pego desobedecendo a restrição, a multa é certa.
IMG_5998_PAN_small_GFLago MoraineIMG_6029_small_GFIMG_6054_small_GF Placa com advertência sobre a presença de ursos - Lago Moraine
A segunda caminhada, talvez a mais bonita das três, foi por uma trilha que leva ao Bow Hut (refúgio), que pertence ao ACC – The Alpine Club of Canada, ou Clube Alpino do Canadá. O início da trilha fica no lago Bow, à margem da Icefields Pkwy. Essa foi a trilha menos frequentada que fizemos. Depois de um certo ponto encontramos apenas com uma simpática senhora de BC que guiava três jovens até o refúgio. Foi também a trilha mais tensa. Percorremos um longo trecho em floresta em uma região bem barulhenta por causa do rio que acompanha a trilha. Por causa da trilha sonora do rio, é necessário fazer mais barulho para alertar os ursos sobre a nossa presença. E caminhar morro acima gritando exige um fôlego extra. Como nesse dia já estávamos em melhor forma, não penamos tanto para percorrer a trilha. Diferente da caminhada anterior, desta fez caminhamos bastante por morainas com pedras grandes e de formação bem diferente do que estavamos acostumados a ver. Ao sairmos da floresta encontramos pela primeira vez o grupo que também se dirigia ao refúgio, que havia parado para lanchar. A senhora se espantou pelo fato de que estávamos preocupados com os ursos. Segundo ela no Brasil tem muita aranha, então devíamos estar acostumados com “bichos”. Tá certo que pela experiência dela nossa preocupação poderia ser de certa forma excessiva, mas sua comparação não foi muito justa. Desse trecho em diante nos sentimos mais à vontade, não pela comparação aranha/urso, mas por termos saído da floresta. É muito bom caminhar em trilhas abertas - mesmo no Brasil não gosto de caminhar em mata por causa do calor. Seguindo em frente foi apenas o vento na cara, rochas, riachos e os picos em volta do anfiteatro que aos poucos se abria no final do vale. Nada de urso perturbando as ideias…
IMG_6069_PAN_small_GFLago Bow IMG_6110_small_GF Transição entre floresta e moraina
IMG_6113_PAN_small_GFVista do anfiteatro – Diagonal direita e acima: Monte Bow com o glaciar Wapta na sua base
IMG_6205_small_GFUma das cachoeiras formadas pelo degelo do glaciar Wapta
Paramos para lanchar em um dos enormes blocos de pedra bem no meio do anfiteatro e aproveitamos o tempo para visualizar o caminho que faríamos para encarar a íngreme subida até o refúgio. Depois de cruzar o riacho que divide o vale e encontrar a trilha entre as pedras, seguimos morro acima ziguezagueando à esquerda de uma das cascatas formadas pelo degelo do glaciar Wapta. Durante a subida fomos intercalando a frente da trilha com o outro grupo e chegamos praticamente juntos ao refúgio Bow (2.440 m). A gentil senhora, que é sócia do ACC e que infelizmente não lembro o nome, nos convidou para conhecer as dependências do refúgio que naquele momento estava vazio. Muito bacana e bem estruturado o local, fiquei imaginando como deve ser passar a noite ali olhando para um céu espetacular. Depois de conhecer o interior do refúgio sentamos no deque panorâmico para uma conversa descontraída com o pessoal e logo depois seguimos até a base do glaciar Wapta.
IMG_6127_small_GF Parte alta da cachoeira com a vista do vale bem abaixo
IMG_6152_small_GFÁrea social do refúgio Bow IMG_6167_PAN_small_GFA caminho do glaciar Wapta – Diagonal esquerda e abaixo: Refúgio Bow
IMG_6179_small_GFBase do glaciar Wapta – Diagonal esquerda e acima: Monte Bow
Após umas voltas nas proximidades do glaciar resolvemos tomar o caminho de volta, pois o tempo estava fechando e parecia que ia chover. Chegamos a pegar alguns pingos quando saimos do refúgio e durante a subida ouvimos muitos trovões. Então não seria bom facilitar. A descida foi relativamente rápida e no caminho cruzamos com diversos montanhistas que estavam indo pernoitar no refúgio. Foi uma ótima caminhada em vários aspectos: a beleza cênica, encontrar pessoas simpáticas e vimos que não estávamos tão “na capa” assim – apenas enferrujados. Conseguimos fazer o percurso em quatro horas e meia, um bom tempo tendo como referência as cinco ou seis horas citadas no guia que levamos. O objetivo não é bater recorde de tempo, até porque gostamos de curtir bastante a caminhada. Esse tipo de comparação é interessante para calibrar a dificuldade citada pelo guia com a nossa capacidade de caminhar, assim temos como avaliar melhor as dicas deles e dosar melhor a caminhada seguinte. Nessa mesma trilha que leva ao refúgio Bow existem outras duas atrações que exigem bem menos dos caminhantes, pois a maior parte do caminho é plana e segue margeando o lago Bow. A primeira é um enorme bloco de rocha que serve como ponte para atravessar o rio e dar acesso a trilha que vai em direção ao Bow. A segunda é a cachoeira do glaciar Bow. Havíamos pensado em passar na cachoeira na volta, mas como a bota da Stela continuava machucando seu pé, resolvemos seguir para o estacionamento. Seguindo o mesmo esquema de intercalar o passeio a pé com o de carro, fomos depois da caminhada visitar o lago Peyto, que fica a poucos quilômetros do lago Bow. Infelizmente no horário que fomos o sol estava bem de frente para o mirante e havia uma névoa bem densa também, o que acabou prejudicando a vista, mas não o passeio.
IMG_6186_PAN_small_GF Riacho formado pelo degelo do glaciar WaptaIMG_6201_small_GFTravessia de um dos riachos abaixo do glaciarIMG_6232_small_GFPonte de pedra
Aproveitamos o dia seguinte ao da caminhada do Bow Hut para mudar de acampamento. Já vacinados quanto a lotação das melhores áreas de acampamento, fomos cedo para o Yohoo National Park conseguir uma vaga no camping Kicking Horse. Essa foi a nossa base para a terceira caminhada. Depois de montarmos a barraca aproveitamos o dia para passear de carro. Fomos conhecer o lago Emerald e naquela de ir até ali, acabamos dando uma volta no lago. Um giro fácil de 5 km que vale a pena ser feito. De lá fomos até Golden (BC), distante uns 65km, tomar um sorvete e conhecer um pouco mais a Colúmbia Britânica. A serpenteante estrada que acompanha o vale do rio Kicking Horse, que dá nome à área de acampamento onde ficamos, é magnífica. A paisagem predominante é de florestas com os picos um pouco mais longe. Novamente não fomos privilegiados pela vista em função de uma névoa que mais tarde fomos descobrir ser proveniente de queimadas. Mesmo assim não temos do que reclamar, pois o tempo sempre esteve ao nosso favor durante a viagem. Paramos em um bem estruturado centro de visitantes e depois de tomar o sorvete voltamos morro acima até a pequena Field, praticamente um “arraial” de trezentos habitantes, já bem próximo do acampamento. Essa simpática cidadezinha surgiu durante a construção da ferrovia Canadian Pacific. Hoje abriga o centro de visitantes do Parque Nacional Yoho e, pelo que pude ver, tem várias pousadas e pequenos hoteis, além de um café/mercadinho que abastece quem por ali passa. Nessa mesma área fica o ponto de partida para quem pretende visitar a região do lago O’Hara, que também ficou na nossa lista de desejos. Para se ter uma ideia, durante a alta estação é necessário reservar com três meses de antecedência uma vaga no ônibus que leva até o lago, pois em função do controle do número de visitantes não é permitido ir de carro. Nos disseram que algumas vagas no ônibus são reservadas para quem compra a passagem no dia, mas mesmo assim, como já estávamos com os dias contados e teria que chegar muito cedo para conseguir o lugar, resolvemos não olhar essa opção. Além de já estarmos super satisfeitos com o que já tinhamos feito, as trilhas da região do O’Hara seguem o esquema de controle do número de pessoas nos grupos de caminhada por causa de ursos.
IMG_6282_PAN_small_GFLago Emerald IMG_6387_small_GF Noite na área de acampamento Kicking Horse
IMG_6528_PAN_small_GFMaciço ao sul da área de camping Kicking Horse – à direita: Cathedral Crags (3.073m)
No dia da nossa terceira caminhada a previsão do tempo não era das melhores, pois havia a possibilidade de chuva. Mesmo assim seguimos para trilha Iceline e ver o que aconteceria. Acredito que apesar de ser mais longa e o ganho de altitude ser maior, algo próximo dos 700 m, essa trilha seja um pouco mais fácil do que a trilha que leva ao Bow Hut. Isso provavelmente pelo fato de se caminhar a maior parte do tempo em terreno regular e menos íngreme. Enfim, não lembro de ter sofrido - memória de montanhista costuma ser curta pra essas coisas. A trilha Iceline está no Yoho National Park e uma das opções de caminhada é um circuito de aproximadamente 21 km, o que fizemos. A saída fica no estacionamento da Takakkaw Falls (cahoeira), segue-se pela trilha Iceline até o refúgio Stanley Mitchell e a volta é pelas trilhas Little Yoho Valley e Yoho Valley até o estacionamento de saída.
IMG_6396_small_GF Cachoeira Takakkaw vista a caminho da trilha Iceline
IMG_6412_PAN_small_GFJá na trilha Iceline – Trecho de floresta e a Takakkaw ficando para trás
O início da caminhada é relativamente pesado, pois é onde se vence o maior desnível da trilha em um trecho relativamente curto e sobe-se gritando por uma hora e meia pela floresta :-/ . Ajuda um pouco o fato do piso ser de terra batida, mas se estiver molhado não deve ser muito bom… Passado esse trecho de floresta, é possível retomar o fôlego e seguir o caminho das pedras pela Iceline. A trilha é linda, caminha-se o tempo todo por uma moraina tendo à esquerda os glaciares Daly e Emerald e a face oeste do pico The Vice President. À direita, a cachoeira Takakkaw está presente a maior parte do tempo. É muito bacana sair da trilha praticamente ao pé da cachoeira e na medida que se ganha altitude vê-la diminuir de tamanho, ficando cada vez mais longe. A trilha tem menos neve do que eu esperava, mas com certeza esse nome vem de outros tempos, quando provavelmente a precipitação deveria ser bem maior do que hoje em dia. O caminho é intercalado por pequenos lagos e riachos provenientes das geleiras e, em alguns pontos, um pouco de neve. A trilha é relativamente movimentada, mas nada que chegue a incomodar.
IMG_6419_PAN_small_GF Trilha Iceline com a cadeia President ao fundoIMG_6472_PAN_small_GFEm direção ao vale Little Yoho depois de ter passado pelo ponto mais alto da trilha – ao fundo o glaciar Des Poilus com o pico Isolated à direita e o monte McArthur à esquedaIMG_6476_small_GF
Seguimos até o ponto mais alto da trilha que fica a 2.230m . Nossa intenção era voltar pelo lago Celeste, mas seguimos a dica da senhora que conhecemos na trilha do Bow Hut, que nos disse que esse lago não acrescentaria nada ao percurso. Assim, resolvemos tocar para o refúgio Stanley Mitchell e fazer o caminho das “trilhas Yoho”. Pouco tempo depois do ponto mais alto chegamos novamente próximo às árvores e aos poucos fomos descendo até o refúgio, onde paramos para lanchar. Desse ponto em diante a caminhada é uma longa descida pela floresta até o estacionamento. Em alguns pontos avistam-se cachoeiras, árvores com respeitosos troncos e, na parte final, a trilha segue pararela ao rio Yoho, cuja corredeira é bem forte. Acredito que se minha câmera fotográfica tivesse um melhor desempenho em locais com pouca iluminação eu curtiria um pouco mais as caminhadas nesses ambientes de vegetação mais densa, pois não se pode negar que a vegetação é exuberante. Além da câmera não ajudar, do “cume” da Iceline em diante a bateria começou dar sinal de fraqueza e as pilhas reservas que havia dado carga na noite anterior também não estavam legal. Então, nesse último terço tive que ir dosando o dedo para não ficar sem bateria, mas deu para chegar no final com ela funcionando. Acho que está na hora de comprar novas baterias, essas são de 2008 e 2009, ou quem sabe uma nova câmera :). Apenas como dica, um caminhada que deve ser bem interessante é uma travessia desde o lago Emerald passando pelo passo Yoho e seguindo em frente pela Iceline. Apesar dos longos trechos em floresta, deve ser um passeio e tanto para se fazer em dois dias.
IMG_6434_small_GFGarotada na trilha Iceline
IMG_6498_small_GF De volta à floresta depois de passar pelo refúgio Stanley Mitchell. Ao fundo monte que acredito ser o Daly 3.152m
IMG_6602_PAN_small_GFCastle Mountain – próximo a Castle Juction
O restante da viagem e os intervalos entre as caminhadas foi para curtir a paisagem passeando de carro em pontos turísticos da região. Na visita que fizemos ao Kootenay National Park conseguimos ver um urso relativamente próximo da rodovia. Como havia um riacho entre nós e ele estava mais interessado em comer suas frutinhas silvestres, foi possível observá-lo sem problema. Novamente a câmera me deixou na mão em função da distância e movimentação rápida do urso :-/. Conhecemos os lagos Minnewanka e Spray que ficam respectivamente próximos às cidades de Banff e Canmore e uma estação de esqui que não lembro o nome. A única coisa que lembro da tal estação de esqui é que na volta ficamos presos por 2 horas na estrada em função de uma família alemã que engastalhou seu motorhome ao tentar fazer um retorno em um trecho da estrada menor que o ônibus… A cidade de Banff, afora sua localização privilegiada entre as montanhas, é tipicamente turística. É toda charmosinha, lojas de souvenires e artigos de montanhismo para venda e aluguel pra todo lado. Como o tempo estava num “chove não molha” rodamos bastante por lá. A Stela acabou encontrando por um preço bom sua mochila de 40l e vermelha, como ela queria. Estamos com a meta de fazer caminhadas com dois pernoites, quem sabe três, usando essas mochilas menores. Veremos!
IMG_6674_small_GF Urso grizzly saboreando suas frutas silvestres – estrada dentro do Parque Nacional Kootenay
IMG_6568_PAN_small_GFLago e reservatório Spray – proximidades de CanmoreIMG_6621_small_GFAve com seu ninho sobre a estrutura da ponte sobre o rio Bow - próximo a Castle Junction
IMG_6582_small_GF Cabra (?) próximo ao lago Minnewanka
As duas últimas noites dormimos em Canmore no hostel do Alpine Club of Canada, que fica junto à sua sede nacional. Que lugar bacana. Afastado da cidade na medida certa, ambiente aconchegante e com uma bela vista para as montanhas Three Sisters. Passamos uma noite no hostel propriamente dito, em quarto coletivo e a segunda noite em uma cabana com quarto privado e cozinha compartilhada. Fizemos nossa tradicional última noite de “chutar o balde” acompanhada de vinho, queijo e comida boa. No dia seguinte foi difícil encarar as Three Sisters na manhã de céu azul e ir para Calgary pegar o vôo de volta para Waterloo. Como costumo dizer: a carruagem virou abóbora! Ficou muita coisa para fazer por lá: região do lago O’Hara, dezenas de refúgios do ACC etc. Sem contar a tal cidadezinha chamada Nelson ao sul da Colúmbia Britânica, comentada pela Helena e Ricardo na noite que estivemos com eles e o Ian. Fiquei curioso… O duro disso tudo é saber que tem muita coisa para percorrer pelo mundo afora com tão pouco tempo disponível. Seguem abaixo mais algumas fotos :)
IMG_6730_small_GF Three Sisters vistas a partir da sede/albergue do Alpine Club of Canada
IMG_6269_small_GFIcefields parkway com o lago Bow ao fundo
IMG_6056_small_GFUm dia, quem sabe???
IMG_6298_PANcr_small_GF Lago Emerald, Yoho National Park
IMG_5948_PAN_small_GFParte alta do glaciar Victoria com a “The Death Trap” ao centro. À esquerda e acima: Monte Lefroy 3.423m – vista do mirante da trilha Plain of the Six Glaciers (Lake Louise)
IMG_6106_small_GF Subida para o refúgio Bow - entrada na floresta
IMG_6536_small_GF Monte Stephen 3.199m – vista do acampamento Kicking Horse
IMG_6038_small_GFLago Moraine

10 comentários:

  1. Queridos, resultado deslumbrante... um banquete para os olhos e para a alma.... um dia ainda compro uma cadeira cross road e encaro uma aventura saborosa como essa.. parabéns!

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  2. Jairo, não precisa cadeira cross road para aproveitar grande parte desse passeio que fizemos. Tirando as trilhas propriamente de caminhada, praticamente tudo é acessível. Inclusive as áreas de acampamento. Não sei se no seu caso é possível, mas tem muito passeio a cavalo também. Abração e obrigado pela visita,
    Max.

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  3. Maravilhoso é pouco. Coloca tudo em livro, eu compro e quero o meu autografado. Parabéns e Muito obrigada por me proporcionar conhecer junto com vocês, só que daqui de casa. Abraços

    Sueli

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  4. Meninos, sensacional essa viagem!!! Fiquei babando nas fotos e nas paisagens..inveja boa viu? rsrs...Saudades de vcs, fazem muita falta aqui perto da gente! bjão!

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  5. Oi Sueli. Tô muito longe dessa história de livro. Nem para o blog tenho disciplina para escrever. Abração e até mais. Max

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  6. Oi Alinne, foi muito bacana mesmo. Pode estar certa de que pensamos, de verdade, em todos os amigos montanhistas quando vamos nesses lugares. Abração, Max

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  7. Olá! Adoro viajar nestas deslumbrantes paisagens postadas no Blog. Viajo também nos comentários, muito envolventes e bem escritos por Max. Parabéns!
    Saudades de vcs, Fabiana

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  8. Oi Fabiana, obrigado pela visita e comentário. Sabendo que tem muita gente lendo - e gostando, fico mais animado para manter o blog atualizado.
    Abração, Max.

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  9. Grande Max, Cara, além de exelente arquiteto é uma exelente fotografo. Tem alguma coisa que você não é bom?...rs Parabéns pelo Blog e pelo trabalho que vem fazendo nele. Abraço

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  10. Max / Stela
    Simplesmente maravilhoso!!! Quando vocês trocarem as caminhadas pelas motos, convidem-me.
    Abraços,
    João Tadeu.

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